DEPRESSÃO: quando os pensamentos se tornam um ciclo vicioso

A Depressão é caracterizada por sentimentos de tristeza, desalento, pessimismo… e uma perda geral de interesse pela vida, combinados com um sentimento de mal estar físico e de incapacidade generalizada. A maioria das pessoas experimenta estes sentimentos como reacção normal a um dado acontecimento (ex: luto). Mas se a depressão ocorrer sem causa aparente ou é demasiado profunda ou persistente, é necessário recorrer a ajuda especializada.

Os sintomas variam com a gravidade da doença. As pessoas deprimidas têm, em geral, uma visão negativa de si próprios, do seu ambiente e do futuro. Percepcionam-se como não tendo valor, inadequados, indesejáveis e deficientes (Young, J.; Beck, A. , Weinberger, A. 1993).

Na depressão ligeira, os principais sintomas são ansiedade e um humor instável e por vezes, crises de choro sem razão aparente. Numa depressão mais grave, os sintomas podem ser falta de apetite, dificuldade em dormir, falta de interesse e prazer nas atividades sociais, sensação de cansaço e falta de concentração. Os movimentos e o raciocínio podem tornar-se mais lentos; em alguns casos a pessoa torna-se mais agitada e ansiosa. As pessoas gravemente deprimidas podem ter ideias de morte e/ou suicídio e alimentar sentimentos de culpa e de inutilidade. A intensidade dos sintomas pode variar com a altura do dia. Em geral, os deprimidos sentem-se melhor à medida que o dia avança, mas em algumas pessoas os sintomas pioram à noite. Se a depressão não tiver tratamento, os sintomas os sintomas tornam-se cada vez mais evidentes. A pessoa pode retrair-se completamente e passar a maior parte do tempo na cama , isolada de tudo e de todos.

As causas podem ser de vária ordem, desde algumas doenças físicas (infecção viral) ou desordens hormonais. A hereditariedade (genética da família) pode ter o seu papel. Mas além das causas biológicas, são fundamentais os factores sociais, ambientais e relacionais. As crises depressivas estão muito relacionadas com acontecimentos perturbadores (falecimento de ente próximo, desemprego, etc) e com fases críticas do ciclo vital da pessoa (adolescência, maternidade, velhice).

Tratamento da depressão

O tratamento, com terapia cognitivo- comportamental, que realizamos, é muito eficaz para as pessoas cuja personalidade e experiências de vida são a causa principal da doença. A este tipo chamamos depressão reactiva (porque o indivíduo reage a acontecimentos perturbadores). Nestas circunstâncias, a pessoa pode ter uma menor capacidade para lidar eficazmente com situações problemáticas, como a morte de pessoas chegadas, o divórcio ou a separação, a perda do emprego ou problemas graves de saúde. O apoio psicológico é fundamental, que pode variar desde uma abordagem informal ou orientada para a solução dos problemas ou até às abordagens mais estruturadas de uma terapia cognitivo- comportamental, dependendo da personalidade e das problemáticas do indivíduo. É fundamental a escuta ativa e empática do psicólogo, onde o indivíduo pode conversar livremente, sem pressões e sem ser julgado.

Segundo as recomendações da Associação Americana de Psiquiatria, uma combinação de terapia cognitivo- comportamental com medicamentos é mais eficaz do que apenas medicamentos. Esta associação ainda recomenda como tratamento de eleição para a depressão ligeira a moderada, a terapia cognitiva ou esta terapia em conjugação com medicamentos.

O prognóstico é bom em relação à maior parte dos indivíduos, desde que tenham tratamento e vigilância adequados. O principal risco é o suicídio, cuja causa, em mais de 80% dos casos, é a depressão.

Qual a eficácia da “terapia psicológica” que realizamos ?

A eficácia da psicoterapia cognitivo- comportamental tem sido confirmada por muitos estudos nos últimos 20 anos. Os estudos indicam que a predisposição genética contribui apenas 16% para a depressão, e que os acontecimentos de vida são a causa mais importante, para a grande maioria das pessoas.

Os medicamentos são a forma mais comum de tratamento da depressão e há uma crença generalizada que são o tratamento mais eficaz. Mas esta crença não é confirmada por muitos estudos cuidadosamente conduzidos nas últimas décadas.  No caso da depressão ligeira a moderada, a terapia psicológica é tão ou mais eficaz que os medicamentos ( William G. Danton, Gurland Y. DeNelsky). A eficácia da terapia cognitivo- comportamental na depressão é notável, sendo mais eficaz que a farmacoterapia (Dobson, 1989).

Infelizmente ainda existe algum preconceito ou relutância em procurar ajuda para problemas emocionais, como a depressão. Os seus sintomas são vistos, habitualmente, como um sinal de fraqueza em vez de um sinal de que algo não está equilibrado e que é um sinal de auto-estima procurar ajuda, em vez de continuar sozinho num ciclo de auto-crítica ou negativismo.

O que faz o psicólogo? Qual o papel da psicologia no tratamento da depressão?

O modelo “cognitivo” da depressão afirma que os nossos pensamentos, crenças, comportamentos e bioquímica são todos componentes importantes dos transtornos depressivos. Cada abordagem de tratamento tem o seu “foco de conveniência”. O médico intervém a nível bioquímico, o psicólogo intervém nos pensamentos, crenças, afetos e comportamento. Quando mudamos os pensamentos depressivos, simultaneamente mudamos o humor, o comportamento e (provavelmente) a bioquímica. Uma “cognição” refere-se á forma como olhamos as coisas- é a forma como interpretamos o mundo. Nós sentimo-nos mais tristes ou mais felizes em função do que estamos a pensar num determinado momento. As pessoas deprimidas tendem a distorcer a realidade, vendo o mundo de uma forma peculiar. A terapia ajuda a reconhecer e a modificar os padrões de pensamento distorcidos, automáticos e irrealistas e substituir estas formas de pensamento por outras mais realistas e adaptadas à realidade.

 

Alguns dos pontos que se trabalham com a terapia são:

– Identificar quais são os problemas da vida que estão a contribuir para a depressão. Identificar opções para o futuro e definir objetivos realistas a atingir, para melhorar o estado emocional.

– Compreender regras, pressupostos, padrões de pensamento que contribuem para um sentimento de depressão. Modificar crenças irracionais e improdutivas.

– Identificar as formas distorcidas de pensamento que contribuem para a tristeza e desesperança.

– Identificar outros padrões de pensamento e de comportamento que contribuam para manter a depressão. (Ex: Frequentemente, as pessoas deprimidas “aprendem” a isolar-se de outras pessoas ou a pensarem em acontecimentos negativos, de forma constante. Aprender  competências sociais ou programar actividades de prazer são metas frequentes de tratamento).

– Ajudar as pessoas a ganhar um sentido de controle da vida e a tirar prazer com as experiências de vida.

 Em que difere a terapia cognitiva de outros tipos de terapia?

Na terapia cognitiva que realizamos, o terapeuta e o cliente têm um papel ativo, onde são trabalhados por ambos diversos problemas, com recurso a técnicas, estratégias e exercícios que deverá fazer entre as consultas. Enquanto que em alguns tipos de terapia o psicólogo têm um papel pouco ativo, onde o cliente pouco mais faz do que falar, na terapia cognitiva definem-se objetivos e formas de os atingir. Por entre um grande número de técnicas/ estratégias que são utilizadas, por exemplo, o cliente vai registar em folhas de exercícios os “pensamentos disfuncionais” e aumentar a consciência dos padrões de pensamento que utiliza:

– Catastrofização: pensar apenas no pior que pode vir a acontecer, sem ter em consideração outros desfechos possíveis. Acreditar que o que pode acontecer é insuportável, em vez de ver os acontecimentos em perspetiva.

– Filtro Mental: focar-se apenas em acontecimentos negativos e desvalorizar ou ignorar o positivo. Ex. Focar-se numa crítica que recebeu e ignorar e esquecer qualquer elogio. Centrar o pensamento numa pessoa com quem se zangou e esquecer ou desvalorizar os amigos que tem. Dar uma atenção desproporcional às situações de vida.

– Leitura Mental: Acreditar que sabe o que as pessoas pensam, como se estivesse a ler os pensamentos dos outros. Ex. Noto que todas as pessoas pensam mal de mim.

Depois são identificados temas de vida, atitudes, regras ou leituras sobre as pessoas e as situações de vida que em geral mantêm uma visão depressiva. A terapia pode então ensinar competências para lidar com os problemas mais comuns que mantêm a depressão que são:

– Desesperança: Acreditar que nada funciona ou vai funcionar. Aprender a ultrapassar a perda de esperança e pessimismo. Aprender a focar o pensamento no que é útil, eficaz, produtivo e prazeiroso.

– Rotulação: Acreditar que é um perdedor, sem valor. Nesta situação pretende-se gerir o auto- criticismo  e reduzir a ruminação dos pensamentos de que fez algo de errado ou que há algo de errado consigo. Ninguém é 100% errado ou 100% perfeito. Todos estamos neste continuum de aprendizagem e imperfeição.

– Perfecionismo, não suportar cometer erros. Aprender a separar a auto-estima do comportamento. O nosso valor não se mede pelo número de erros ou sucessos que atingimos!

– Desmotivação. Não ter energia para fazer nada. Trabalha-se a motivação em consulta e como se pode aumentar gradualmente a energia e o sentimento de estar a fazer algo produtivo.

– Ruminação. Estar constantemente a ruminar sobre o passado, sobre erros ou situações mal- sucedidas. Neste ponto trabalha-se em consulta formas de aceitação de emoções e pensamentos inúteis ( até que se evaporem!) e de focar o pensamanto em atitudes úteis.

– Isolamento. Não suportar estar sozinho (a) e não conseguir manter relações sociais satisfatórias. Talvez o aspecto mais importante na manutenção de bom estado de humor esteja na habilidade de desenvolver e manter boas relações sociais e pessoais.

Os nossos sentimentos são, sem dúvida, influenciados pelos acontecimentos de vida, pela nossa bio-química e por acontecimentos traumáticos do passado. Mas os nossos sentimentos não estão fora do nosso controlo. Podemos aprender a mudar a maneira de pensar e, consequentemente, a maneira de sentir. As mensagens que damos a nós próprios têm um grande impacto nas nossas emoções. A tristeza e depressão resultam muitas vezes de sentimentos de perda, acreditando que perdeu algo de importante para a auto- estima.

As pessoas que ultrapassam a depressão através da psicoterapia têm mais hipóteses de continuar bem e de não terem recaídas, em comparação com aquelas que só foram tratadas com anti-depressivos. Os medicamentos podem ser úteis para alguns indíviduos, especialmente nas depressões mais severas- combinados com a psicoterapia para um máximo efeito. (Burns, D. , 1999)

Bibliografia consultada (essencial):

Alford, B.A., Beck, A.T., The Integrative Power of Cognitive Therapy. The Guilford Press, 1998

Dobson,K.S. et al (2006) Manual de Terapias Cognitivo- comportamentais. Porto Alegre: Artes Médicas.

Fochtmann LJ, Gelenberg AJ: Guideline Watch: Practice Guideline for the Treatment of Patients With Major Depressive Disorder, 2nd Edition. (2005) Arlington, VA: American Psychiatric Association.

Leahy, Robert (2010) Beat the Blues before they beat you. Hay House Inc.

 

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